Descubra como a evolução da visão, a linguagem e a Sprachfähigkeit moldaram nossa história como seres humanos


1. Aprendendo a Ver


O mundo à nossa volta é um mundo principalmente apreendido pela visão, são paisagens, objetos, referências turísticas, são cores e formas. No entanto, a correlação tão evidente para nós modernos, entre o ato de ver e pensar, não data do Século das Luzes, que não fez mais do que redescobri-la e institui-la como eixo fundamental do paradigma racionalista baseado no exercício da razão critica, no predomínio da visão sobre os outros sentidos e na invenção de um tipo de olhar distanciado sobre as coisas, um olhar que passou a ser considerado objetivo e científico.

A importância da visão na apreensão do mundo é algo que remonta à antiguidade grega, onde a visão gradualmente se sobrepôs aos outros sentidos. Isso pode ser visto na Parábola da Caverna de Platão, que tematiza o conhecimento através da visão.

Constatamos uma evolução semelhante na Antiguidade grega quando, ao longo de vários séculos, a visão se vai sobrepondo progressivamente aos outros sentidos - evolução que encontra a sua expressão eximia na Parábola de Platão onde é tematizado o conhecimento através de, e com base na visão (Manthey, 1983).


2. Evolução da Visão


Na Biologia da Evolução, é considerado um fato que o homem é um animal visual, e alguns neuroevolucionistas acreditam que a evolução de sua visão tridimensional foi um fator determinante para a dominação do meio terrestre pelos humanos. Isso ocorreu devido ao desenvolvimento de um tipo de visão complexa chamada binocular pelos primatas, nossos antepassados longínquos, que viviam na floresta e tinham que se movimentar rapidamente pelas árvores.

“O homem é um animal visual”, asserção esta que é confirmada pelo fato de que alguns neuroevolucionistas acreditam que o homem dominou o meio terrestre graças à evolução de sua visão, sua visão tridimensional.

A citação "O homem é um animal visual" é frequentemente utilizada para destacar a importância da visão no desenvolvimento humano. De fato, a visão é um dos principais sentidos humanos, e é através dela que somos capazes de apreender o mundo ao nosso redor, identificar objetos e pessoas, e compreender a relação entre eles.


3. "O homem é um animal visual"


 A citação "O homem é um animal visual" não possui uma autoria específica, sendo uma afirmação geralmente atribuída a neurocientistas e biólogos evolutivos que estudam a visão humana e sua relação com a evolução. É uma ideia que tem sido explorada ao longo da história da filosofia, com diversos pensadores enfatizando a importância da visão para o conhecimento e compreensão do mundo. Por exemplo, Platão em sua "Alegoria da Caverna" e Descartes em suas Meditações filosóficas, destacaram a importância da visão para a aquisição do conhecimento e da verdade.

A afirmação tem origem na biologia evolutiva, e é baseada na ideia de que a evolução da visão tridimensional foi fundamental para a adaptação humana ao ambiente terrestre. Os primatas, nossos antepassados, desenvolveram a visão binocular para se movimentar rapidamente pelas árvores da floresta, e quando se tornaram bípedes e passaram a viver no chão, essa mesma visão tridimensional se mostrou extremamente útil para caçar e se defender de predadores.



Essa evolução da visão foi acompanhada por uma evolução do sistema cognitivo dos hominídeos, que se tornaram capazes de processar informações visuais cada vez mais complexas e desenvolveram a capacidade de reconhecer e distinguir objetos e pessoas. Essa habilidade cognitiva se tornou um pré-requisito para o desenvolvimento da linguagem, uma vez que a comunicação verbal se baseia em grande parte na capacidade de identificar e nomear objetos e conceitos.

Ao longo da história, a visão continuou a ser considerada o sentido mais importante para o conhecimento e a compreensão do mundo. Na Antiguidade grega, por exemplo, a visão se sobrepôs progressivamente aos outros sentidos, como é evidenciado na Parábola da Caverna de Platão. Na era moderna, a visão se tornou ainda mais valorizada, sendo considerada um instrumento fundamental para a investigação científica e para o exercício da razão crítica.

No entanto, é importante lembrar que a visão não é o único sentido importante para a compreensão do mundo. Os outros sentidos, como o tato, o olfato e o paladar, também desempenham um papel fundamental na percepção sensorial e na construção de significado. Além disso, a visão pode ser afetada por doenças, lesões e outros fatores, o que pode comprometer sua capacidade de apreender o mundo ao nosso redor.

Em resumo, a citação "O homem é um animal visual" destaca a importância da visão na evolução e no desenvolvimento humano, mas é importante reconhecer que a percepção sensorial é um processo complexo e multifacetado, que envolve todos os sentidos e que pode ser afetado por diversos fatores.


4. "Nascimento" da Visão Binocular


Com efeito, os primatas, nossos antepassados longínquos, devido ao seu modo de vida na floresta que implicava movimentações rápidas pelas árvores, desenvolveram um tipo de visão particularmente complexa chamada “binocular“.

A partir do momento que ocorreu a bipidização dos primatas os olhos foram se frontalizando, mudando a característica da espécie, de caça para caçador. Daí resultou uma evolução extraordinária do sistema cognitivo e do córtex dos hominídeos.

A visão binocular é uma característica essencial dos seres humanos e outros primatas. Esse tipo de visão permite que os olhos de um indivíduo trabalhem juntos para produzir uma imagem tridimensional única do mundo ao seu redor. Mas como essa característica evoluiu ao longo do tempo?

Os primeiros primatas tinham olhos posicionados nas laterais da cabeça, o que lhes permitia ter uma visão panorâmica do ambiente ao seu redor. No entanto, a desvantagem dessa configuração é que cada olho só pode ver uma parte da cena, o que torna difícil perceber profundidade e distância.

À medida que os primatas evoluíram e começaram a se mover pelas árvores, a lateralização do olhar tornou-se uma desvantagem. Para ter uma visão mais precisa da profundidade e da distância, os olhos precisavam se mover em direção ao centro da face. Isso permitiu que os dois olhos trabalhassem juntos para produzir uma imagem tridimensional do mundo ao redor.

A transição para uma visão binocular frontalizada foi um processo gradual. Uma das primeiras mudanças foi a capacidade de direcionar os dois olhos para a mesma direção, permitindo que os objetos fossem vistos com maior clareza e nitidez. Essa mudança também permitiu que os primatas começassem a caçar presas, o que exigia uma maior precisão visual.



Com o tempo, os olhos se moveram ainda mais para a frente, permitindo uma sobreposição maior das imagens de cada olho. Isso aumentou ainda mais a capacidade dos primatas de perceber profundidade e distância. A visão binocular frontalizada também permitiu o desenvolvimento de uma maior sensibilidade ao movimento, o que foi útil na identificação de presas e na evitação de predadores.

A evolução da visão binocular frontalizada foi um fator importante na evolução dos primatas e na eventual evolução dos seres humanos. Permitiu que os primatas se tornassem melhores caçadores, e também foi um fator importante na evolução da linguagem e do pensamento simbólico. É uma característica única dos primatas e uma das muitas maneiras pelas quais a evolução moldou nossa visão e percepção do mundo ao nosso redor.

 

5. "Sprachfähigkeit"


Foi assim, de fato que se criaram as condições prévias para a invenção da linguagem: pela acumulação de um potencial do sistema cognitivo, a chamada "O homem é um animal visual" – faculdade para a linguagem. (Muller, 1990). E você ainda acha que linguagem e visão não tem nada a ver?

O termo "Sprachfähigkeit" é uma palavra alemã que se refere à "capacidade para a linguagem". A ideia de Sprachfähigkeit foi introduzida pelo filósofo alemão Wilhelm von Humboldt no século XIX para descrever a capacidade dos seres humanos para a linguagem.

De acordo com Humboldt, a Sprachfähigkeit é uma habilidade inata e universal dos seres humanos que lhes permite aprender qualquer língua natural. Em outras palavras, todos os seres humanos têm a capacidade inata de aprender a falar qualquer idioma, independentemente do idioma que seja falado em seu ambiente imediato.

Essa capacidade inata para a linguagem é frequentemente considerada como uma das características distintivas dos seres humanos em relação a outras espécies animais. Embora muitos animais tenham a capacidade de se comunicar uns com os outros, a linguagem humana é única em sua complexidade e flexibilidade.

A capacidade para a linguagem é frequentemente relacionada à evolução da visão binocular. Como mencionado anteriormente, a evolução da visão binocular foi um fator crucial na evolução da Sprachfähigkeit. A habilidade de ver em três dimensões permitiu aos seres humanos uma melhor percepção do mundo em seu ambiente imediato e uma maior capacidade de compreender e manipular objetos e situações em seu ambiente. Essa habilidade, por sua vez, deu origem a uma maior complexidade do sistema cognitivo, incluindo a capacidade de aprender e usar a linguagem.

Assim, a ideia de Sprachfähigkeit sugere que os seres humanos têm uma capacidade inata para aprender e usar a linguagem, que é única em relação a outras espécies animais. Essa capacidade é frequentemente relacionada à evolução da visão binocular e à maior complexidade do sistema cognitivo dos seres humanos.

No entanto, a correlação entre o ato de ver e pensar não é uma descoberta moderna. Foi redescoberta e instituída como eixo fundamental do paradigma racionalista baseado no exercício da razão crítica, no predomínio da visão sobre os outros sentidos e na invenção de um tipo de olhar distanciado sobre as coisas, um olhar que passou a ser considerado objetivo e científico.


 




Referências Comentadas




1. Adrian, E. D. The Basis of Sensation, London: Christophers. 1928.

O livro "The Basis of Sensation" é uma obra clássica escrita pelo fisiologista Edward Adrian e publicada em 1928 pela editora Christophers em Londres. Adrian foi um dos pioneiros no estudo da neurofisiologia, e sua obra é uma contribuição importante para a compreensão dos mecanismos neuronais envolvidos na percepção sensorial, especialmente na visão e na audição. O livro é considerado uma referência fundamental para estudantes e pesquisadores da área de neurociência e fisiologia sensorial. Em seu conteúdo, Adrian aborda os princípios básicos da percepção sensorial, incluindo os aspectos anatômicos e funcionais dos sistemas sensoriais, a fisiologia dos órgãos sensoriais e a codificação neural das informações sensoriais.

2. Manthey, M. (1983). Der Schlüssel zur Erkenntnis. Die Verbindung von Sprache und visuellem Denken bei Plato. Athenäum Verlag.

O livro "Der Schlüssel zur Erkenntnis. Die Verbindung von Sprache und visuellem Denken bei Plato" (A Chave para o Conhecimento. A conexão entre linguagem e pensamento visual em Platão), escrito por Manthey e publicado em 1983 pela editora Athenäum Verlag, aborda a relação entre linguagem e visão na filosofia de Platão, explorando como o pensamento visual foi fundamental para a construção de seu sistema filosófico.

3. Meyer, P.; O Olho e o Cérebro.  Editora Unesp. São Paulo. 1998.

O livro "O Olho e o Cérebro", de autoria de Peter Meyer, aborda a relação entre o olho e o cérebro na percepção visual. O autor discute como o cérebro é capaz de processar as informações visuais capturadas pelos olhos, desde a formação da imagem na retina até a identificação de objetos e a compreensão de suas características. O livro também explora a percepção de cores, profundidade e movimento, além de abordar temas como ilusões de ótica e deficiências visuais. O autor apresenta uma visão interdisciplinar, integrando conceitos de física, biologia, psicologia e filosofia, em uma linguagem acessível para o público geral.Todo aquele que trabalha com reabilitação, Neurorreabilitação visual tem quer ler!

4. Muller, R. A. (1990). Language and visual functions: A comparative study. Journal of Psycholinguistic Research, 19(5), 423-435.

Essa citação se refere à ideia de que a evolução da visão e a capacidade dos primatas de ver em 3D através da visão binocular foram fundamentais para a evolução da linguagem. Segundo Muller, a habilidade dos seres humanos em processar informações visuais e espaciais é importante para a compreensão de conceitos abstratos e a linguagem simbólica. Muller argumenta que a linguagem é uma forma de representação mental que depende de uma estrutura cognitiva complexa, incluindo processamento visual, para ser completamente desenvolvida.

5. Moutoussis K; Zeki S. Motion processing, directional selectivity, and conscious visual perception in the human brain.  Proc Natl Acad Sci U S A; 105(42): 16362-7, 2008 Oct 21.

 Moutoussis e Zeki realizaram um estudo sobre como o cérebro humano processa e percebe o movimento visual. Eles utilizaram a técnica de ressonância magnética funcional para mapear a atividade cerebral em resposta a estímulos visuais em diferentes direções. Os resultados mostraram que as áreas do cérebro responsáveis pelo processamento do movimento são altamente seletivas em relação à direção do movimento. Além disso, eles descobriram que a percepção consciente do movimento está correlacionada com a atividade em uma área específica do cérebro, conhecida como área V5/MT. Esses resultados fornecem insights importantes sobre a maneira como o cérebro humano processa informações visuais em movimento e como isso leva à percepção consciente.



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